quarta-feira, 24 de agosto de 2011

A incompreensível paz que Cristo dá

Por Gutemberg Rocha Filho

O caminho que decidimos trilhar, diariamente nos apresenta tanto os seus favores quanto os seus desfavores; tanto os sabores quanto os dissabores. É fato, dificilmente conseguimos enxergar que isto faz parte do curso desta vida, que os nossos olhos não podem se voltar apenas para as coisas que nos desencantam e desapontam, mas devem fitar-se naquilo que é mais sublime e mais enternecedor: o amor.
Em um dado momento desta caminhada, aprendi que as circunstâncias, sejam elas boas ou ruins, sempre farão parte da minha vida, que todos os dias estarão batendo à minha porta anunciando sua presença, mas aprendi também que não posso guiar-me por vistas, isto é, por aquilo que os meus olhos veem, mas pelo amor. O amor nos ensina a ser temperantes, a enxergar o outro, a amar mesmo quando somos odiados, a perdoar mesmo quando nos negam o perdão.
Nesta corriqueira vida de sempre, somos surpreendidos, inescapavelmente, por diversos entraves, e esses entraves surgem tentando embaraçar nossos pés, embaçar nossa visão, enfim, para desviar-nos da verdadeira rota que nos leva ao encontro com o Divino, com o Supremo, com aquele que nos inspira a vida todos os dias. Mas, em meio a tudo isso podemos perceber o soprar de uma brisa leve e refrescante a oferecer-nos a paz incompreensível e incomparável, invisível, mas inesgotável.
Essa paz que invade todos os cantos de nossa alma, que nos traz a calma em meio a tantos conflitos, que nos faz serenos quando a nuvem negra e densa surge tentando desestabilizar-nos, vem do alto, do Supremo Pastor. O meu desejo é que todos os desesperados, os desalentados, os marginalizados, enfim, os que estão à beira do caminho, sejam alcançados e envoltos por essa paz, não a que o mundo dá, mas a que Cristo dá.
A que o mundo dá é momentânea, mas a que Cristo dá é perene, é incessante. Que durante este longo percurso nós nos esforcemos para nos mantermos fitos em Deus que é a nossa segurança, esperança, confiança... Lembrando sempre que Ele estará presente a todo instante espargindo seu amor.

Só a Ele toda glória.

sexta-feira, 19 de agosto de 2011

Profissão de Fé

Por Frei Betto

Prefiro um ateu que ama o próximo a um devoto que o oprime. Não creio no deus dos torturadores e dos protocolos oficiais, no deus dos anúncios comerciais e dos fundamentalistas obcecados; no deus dos senhores de escravos e dos cardeais que louvam os donos do capital. Nesse sentido, também sou ateu.

Creio no Deus desaprisionado do Vaticano e de todas a religiões existentes e por existir. Deus que precede todos os batismos, pré-existe aos sacramentos e desborda de todas as doutrinas religiosas. Livre dos teólogos, derrama-se graciosamente no coração de todos, crentes e ateus, bons e maus, dos que se julgam salvos e dos que se creem filhos da perdição, e dos que são indiferentes aos abismos misteriosos do pós-morte.

Creio no Deus que não tem religião, criador do Universo, doador da vida e da fé, presente em plenitude na natureza e nos seres humanos.

Creio no Deus da fé de Jesus, Deus que se aninha no ventre vazio da mendiga e se deita na rede para descansar dos desmandos do mundo. Deus da Arca de Noé, dos cavalos de fogo de Elias, da baleia de Jonas. Deus que extrapola a nossa fé, discorda de nossos juízos e ri de nossas pretensões; enfada-se com nossos sermões moralistas e diverte-se quando o nosso destempero profere blasfêmias.

Creio no Deus de Jesus. Seu nome é Amor; sua imagem, o próximo.


Frei Betto é escritor, autor, em parceria com Leonardo Boff,
de “Mística e Espiritualidade” (Vozes), entre outros livros.

segunda-feira, 1 de agosto de 2011

Motivo

Por Cecília Meireles

Eu canto porque o instante existe
e a minha vida está completa.
Não sou alegre nem sou triste:
sou poeta.

Irmão das coisas fugidias,
não sinto gozo nem tormento.
Atravesso noites e dias
no vento.


Se desmorono ou se edifico,
se permaneço ou me desfaço,
- não sei, não sei. Não sei se fico
ou passo.

Sei que canto. E a canção é tudo.
Tem sangue eterno a asa ritmada.
E um dia sei que estarei mudo:
- mais nada.